Registros de outro tempo
Exposição "A voz das cores" resgata talento do arquiteto José Lutzenberger para aquarelas
Em cartaz na Pinacoteca Ruben Berta, mostra inclui também desenhos e objetos do artista
Alguns
de nós passam pelas obras de José Lutzenberger (1882 – 1951) todos os
dias. A Igreja São José (Alberto Bins), o Palácio do Comércio (Largo
Visconde do Cairú, 17) e o Orfanato Pão dos Pobres (Rua da República,
801), todos localizados em Porto Alegre, levam sua assinatura de
arquiteto, como outros edifícios que mantêm o passado presente na
Capital e no Interior. Suas aquarelas são mais difíceis de encontrar,
mas também são resquícios da primeira metade do século 20. Numa escala
bem menor, registram e comentam os dramas do dia a dia de sua época. A
mostra A voz das cores é uma oportunidade para vê-las.
Em
cartaz até 24 de fevereiro, a exposição comemora os três anos da
transferência da Pinacoteca Ruben Berta para o belo casarão do século 19
no número 973 da Rua Duque de Caxias. Suas três salas estão ocupadas
com cerca de 40 itens, entre aquarelas, desenhos e objetos pessoais de
Lutzenberger garimpados nos acervos da Fundacred, do Margs e da família
do artista.
Produzidas entre as décadas de 1920 e 1940, as
aquarelas trazem cenas do cotidiano. Uma delas revela um senhor com os
pés abaixo d'água em plena enchente de 1941. Outra retrata homens
dançando na rua vestidos de mulher, antigo costume carnavalesco. Um
conjunto de outras 20 ilustra a vida de imigrantes alemães na Serra.
–
Ele é um cronista que, ao invés da escrita, usava o pincel e o lápis.
Registrava tudo na memória e depois desenhava com precisão – define a
curadora e coordenadora de artes visuais de Porto Alegre, Lou Borghetti.
– Ao mesmo tempo, não são aquarelas inocentes. Elas comunicam um
momento histórico e fecundo e com um senso de humor fantástico.
José Lutzenberger, "Enchente de 1941", 1941, aquarela, 16,0 x 23,0 cm, Pinacoteca Fundacred Foto: Reprodução / Pinacoteca Fundacred
Nascido
na cidade de Altoettg, na Alemanha, Lutzenberger chegou a Porto Alegre
em 1920, aos 38 anos. Dedicou-se à arquitetura e mais tarde, a partir de
1938, à docência no Instituto de Belas Artes da UFRGS, como professor
de Geometria Descritiva, Perspectiva e Sombras. Em paralelo, sempre
desenhou e pintou por prazer, até mesmo durante o período em que serviu
na I Guerra Mundial. Mas recusava a denominação de artista, esquivava-se
de exposições e apenas assinava o nome completo nos projetos
arquitetônicos. Com o tempo, as obras acabaram falando mais alto do que o
próprio autor, que é hoje considerado um dos grandes aquarelistas do
Estado.
Para Lou Borghetti, o reconhecimento a Lutzenberger como
artista permanece aquém da fama como arquiteto e um dos motivos seria a
escala pequena das obras que, no entanto, demandam bastante do
observador
– É tudo pequeno na mostra, você pode olhar rapidamente
e ir embora. Mas é preciso se demorar na frente do trabalho, que é
intimista e requer atenção e vontade.
A curadora afirma que a
riqueza das aquarelas está nos detalhes. Para ajudar os visitantes a
enxergá-los em obras de apenas 20 cm x 20 cm, ou até menos, o museu
disponibilizará três lupas. E há dois trabalhos que foram ampliados.
–
Na aquarela da enchente de 1941, há um senhor andando com um jornal que
diz "Auxílio total ao Rio Grande". Se você aumentar, consegue ler tudo
no tal jornal.
A VOZ DAS CORES – aquarelas de José Lutzenberger
Pinacoteca
Ruben Berta (Rua Duque de Caxias, 973), centro de Porto Alegre. Fone:
(51) 3289-8292. Visitação de segundas a sextas-feiras, das 10h às 18h,
até 24 de fevereiro.
A exposição: com cerca de 40 itens, entre
desenhos, aquarelas e objetos, a mostra apresenta a obra artística do
arquiteto José Lutzenberger (1882 – 1951). Entrada franca.
José Lutzenberger, "Pão dos Pobres," sem data, nanquim, MARGS Foto: Reprodução / Margs
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